quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Os direitos dos portadores de transtornos mentaisPDFImprimirE-mail
SEX, 02 DE OUTUBRO DE 2009 11:38
Em audiência promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados nesta quarta-feira, especialistas cobraram o cumprimento da Lei 10.216/01, que garante proteção e direitos aos portadores de transtornos mentais. Um das reivindicações dos debatedores foi a de que, em vez de em manicômios, o tratamento dessas pessoas seja feito junto aos familiares, para evitar o isolamento.

Diógenes Santos
Fernanda Otoni: Brasil precisa abandonar o velho modelo de tratamento das doenças mentais.


O representante da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial, Marcus Vinícius de Oliveira, ressaltou a necessidade de mudar a terapia de internação e isolamento. "Durante quatro anos e meio, trabalhei com 40 pacientes que eram considerados crônicos, irredutíveis, com alto grau de complexidade psíquica, precários vínculos sociais e fragilidades econômicas. São exatamente desse tipo que se diz que precisam ser internados. Conduzi uma experiência de atenção domiciliar e, depois disso, eles não precisavam mais de internação", contou.

Oliveira disse que os fatores mais importantes no tratamento não são a internação nem os remédios, mas a reintegração familiar e social.

Marcha
Fernanda Otoni, do Conselho Federal de Psicologia, afirmou que o Brasil não precisa de hospitais psiquiátricos, e sim da aplicação dos princípios da luta antimanicomial e da reforma psiquiátrica em todo o País. Segundo ela, a marcha dos usuários de serviços de saúde mental a Brasília, nesta semana, é uma resposta aos que falam num suposto fracasso dessa reforma.

Ela salientou que a luta pelo fechamento de hospitais psiquiátricos é contra a cultura do isolamento e do encarceramento: "É uma luta para substituir esses hospitais por novos serviços capazes de proporcionar um outro tipo de atenção, uma assistência de base comunitária, em convívio com a sociedade."

Conforme ela lembrou, a lei determina que devem ser usados recursos fora dos hospitais, para o Brasil abandonar o velho modelo de tratamento da doença mental. Porém, Fernanda Otoni observou que na prática essas alternativas ainda não foram criadas na proporção da demanda do País.

Leitos
O deputado Germano Bonow (DEM-RS) manifestou preocupação com a velocidade de fechamento de leitos psiquiátricos no Brasil. Ele disse que deixaram de ser oferecidos, em 20 anos, 80 mil leitos, enquanto a população nacional cresceu em 40 milhões de habitantes. Bonow falou sobre as dificuldades em todo o País para os pacientes de doenças mentais conseguirem internação. "Há uma omissão do Poder Público e quem busca alternativas são as comunidades, as igrejas, a sociedade", afirmou.

Já o deputado Dr. Rosinha (PT-PR) avaliou que a marcha dos usuários dos serviços de saúde mental é uma resposta à desmobilização ocorrida depois da aprovação da lei da reforma psiquiátrica, cuja implantação não avançou como deveria. Segundo ele, os setores conservadores, que têm nos doentes mentais uma fonte de lucro, estão reconquistando espaços.

O parlamentar observou que a lei 10.216/01 não é contra a internação de pacientes em surto, mas contra o desrespeito aos direitos humanos e a permanência indefinida em hospitais psiquiátricos.

Notícias relacionadas:
Procurador quer tratamento especial para infrator com transtorno mental
Pacientes podem ganhar direito a revisão de internação em manicômio
Câmara aprova revisão periódica de interdição judicial de pessoas
Aprovada a obrigatoriedade de informar tentativas de suicídio
Profissionais apontam avanços na luta contra manicômios
“A querela dos direitos”: loucos, doentes mentais e portadores de transtornos
e sofrimentos mentais
Rafael De Tilio
Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto-SP, Brasil
Resumo: Implementar e garantir direitos básicos aos portadores de sofrimento mental são
necessidades que a reforma psiquiátrica exigiu. Mas, se em tese estes são considerados sujeitosde-direito, os códigos legislativos brasileiros ainda os qualificam como incapazes e periculosos.
Pretendeu-se, através de leituras da produção científica da área, destacar concepções e práticas
sobre a loucura desde a Antigüidade até os atuais conflitos entre as concepções reformistas e os
Códigos Civil e Penal brasileiros. Como conclusão atenta-se à necessidade de se formarem
profissionais cientes desses conflitos e dispostos a lutar pela reestruturação dos códigos e das
práticas como maneira de efetivar os direitos desses cidadãos.
Palavras-chave: Reforma psiquiátrica. Direitos. Loucura. Doença mental.
“The dispute for rights”: insane people, mentally sick people and sufferers of
mental disorders or stress
Abstract: To implement and to guarantee basic rights to the sufferers of mental disorders are
some of conditions required by the psychiatric reform . Although considered citizens-with rights ,
the brazilian criminal and civil codes still consider them incapable and dangerous. By consulting
specific literature on the subject, it was possible to highlight concepts and practices about insanity
since the Antiquity up to the actual conflicts between reform formulations and the Brazilian Civil
and Criminal codes. In conclusion we call attention to the increasing necessity of training
professionals aware of these conflicts and willing to fight for the reformulation of codes and
practices as to assure the rights of these citizens.
Keywords: Psychiatric reform. Rights. Madness. Insanity.
“Las cuestiones de los derechos”: locos, enfermos mentales y
Introdução
As propostas de reforma psiquiátrica e luta
antimanicomial no Brasil foram influenciadas pelas
experiências de outros contextos sócio-culturais
(Estados Unidos, Itália, França e Inglaterra) visando
reduzir os leitos de internação em hospitais
psiquiátricos, garantir a assistência aos pacientes
egressos desses hospitais, criar e sustentar uma rede
extra-hospitalar adequada (CAPS, residências
terapêuticas, centros de convivência, ambulatórios,
programas de suporte social, entre outros) e defender/
promover os direitos humanos dos pacientes e seus
familiares (os usuários).
Tais propostas de mudanças foram acompanhadas nas décadas de 1990 e 2000 no Brasil por
novas resoluções e portarias do Ministério da Saúde
e leis, principalmente a 10.216 de 2001 de Paulo
Delgado (Brasil, 2001), sobre a reformulação do
modelo assistencial em saúde mental e proteção dos
direitos dos usuários.
Contudo a lei de Paulo Delgado não influenciou
o status sócio-jurídico dos portadores de transtorno/
sofrimento mental: este ainda é definido pelos Códigos
Penal e Civil brasileiros que podem para tais indivíduos
fazer cessar no plano civil a capacidade contratual
do acometido (interdição) e/ou determinar se o
mesmo em casos de atos ilícitos criminais deve ser
internado em instituição de tratamento sem
estabelecer previamente o tempo de internação
(medida de segurança) devido à sua periculosidade. A lei 10.216/2001 atuaria sobre as
possíveis conseqüências, garantindo direitos e
tratamento digno, e não sobre as definições
estatutárias dos portadores de transtornos mentais.
Mesmo assim ela representou avanços significativos
no entendimento e proposição de tratamento
destinado aos denominados “loucos”.
Este artigo visa apresentar de forma esquemática algumas concepções historicamente
localizadas sobre a loucura, as principais propostas
de reforma psiquiátrica feitas a partir do fim da
década de 1960 e suas influências na experiência
brasileira, seus desdobramentos nas proposições de
reordenamento quanto aos direitos e tratamento dos
acometidos, e discutir conflitos implícitos dessa
proposta com concepções vigentes nos Código Penal
e Civil brasileiros.
Histórico e histórias
Um breve histórico daquilo que comumente se
entende por loucura, que tentará apreendê-la como
conceito e prática de cura, será apresentado.
Os tempos da loucura
A Antigüidade, segundo Pessotti (1994a),
propôs algumas conceitualizações e práticas sobre a
loucura, primeiro com Homero (séculos 9-8 a.C.) que
via os comportamentos e atos de pessoas destituídas
de razão como atribuição da ordenação divina
(definição de loucura), desresponsabilizando o
indivíduo acometido das conseqüências de seus atos
pois estaria possesso pelos deuses. Assim, o
acometido não era culpado por seu sofrimento ou pelo
causado a outrem, não sendo estigmatizado nem
considerado doente, não existindo também práticas
específicas para sua cura, sendo no máximo proposto
rituais reparatórios e oferendas para acalmar a ira
divina – tentava-se atingir os deuses, e não os
acometidos.
Ainda na Antigüidade, segundo Pessotti
(1994a), Eurípides (485-406 a.C.) será o responsável
não pela proposição de nova visão sobre a loucura
mas pela inclusão do elemento psicológico humano
em sua dinâmica. Originada do capricho dos deuses
a loucura causava conflitos interiores e dilemas na
alma do homem atiçado em suas paixões que se
transformavam em atos considerados descabidos
frente às normas sociais (basta verificar, por exemplo,
a peça Medeia de Eurípides, 1999). Naquele período
a loucura começava a se afastar do enfoque
mitológico para outro denominado passional. As
práticas continuariam as mesmas do período anterior.
Segundo Pessotti (1994a) a grande virada de
concepções viria com as proposições de Hipócrates
(século 1a.C.) sobre o enfoque organicista da
loucura. O ordenamento divino não seria mais o
responsável pela loucura, mas sim o funcionamento
do organismo sediado no cérebro humano e no
equilíbrio de seus elementos essenciais - os humores
(calor, frio, secura, umidade) – com o ambiente. AsDe Tilio, R. (2007). “A querela dos direitos” 197
práticas de cura e a concepção de saúde física/mental
voltavam-se para o restabelecimento do equilíbrio dos
humores com o meio externo através de alimentação
adequada, oitiva e prática de música, banhos termais,
atividades físicas, regulagem do sono e limpeza do
organismo pela catarse (laxantes naturais e
vomitórios).
Ainda neste sentido Galeno (131 a.C. – 200
a.C., conforme citado por Pessotti, 1994a), pautado
em estudos de dissecação cerebral continuará a
tradição hipocrática definindo a loucura como
manifestação mental de causas orgânicas e
fisiológicas, promovendo um avanço em seu
entendimento nosográfico por intermédio da
classificação sistemática de quadros sintomáticos
(loucuras divididas entre as manias, melancolias,
delirantes, entre outras), cada qual com uma sede e
substrato cerebral específico. As práticas de cura
seguiam as prédicas estabelecidas por Hipócrates.
Mudança significativa só se daria séculos
depois na Idade Média Européia com a loucura
equiparada à possessão demoníaca (Muraro, 1997;
Pessotti, 1994b) na denominada doutrina demonológica, que perdurará até o século XVII, causada
pela não observância dos ditames dogmáticos da
religião, situando o indivíduo numa posição passiva
frente ao acometimento.
Para Muraro (1997) e Pessotti (1994b) esta
determinação demoníaca/possessiva da loucura
retirava qualquer competência médica de seu
entendimento ou tratamento reservando-a a esfera
da fé e da crença, sendo por isso as práticas de cura
as mesmas das expiações dos pecados, como
peregrinações a lugares santos, confissões, ritos de
preces, manifestações de devoção e de caridade (pois
salvar o outro equivaleria a salvar a si próprio),
exorcismo, ingestão e consumo de ervas e xaropes,
autoflagelação e suplícios, torturas para expiar o
demônio e, quando necessário, morte na fogueira.
O século XVII devido à exacerbação do
racionalismo científico que o caracterizou (Foucault,
2000a) reconfigura a loucura no cerne do indivíduo
como perda da razão, da vontade, do livre-arbítrio e
como desajuste da moral (lesão do intelecto e da
vontade), cuja cura deveria ser a estabilização do
acometido num tipo social e moralmente aceito. Assim
surgem os grandes asilos (Foucault, 2000b),
instituições concebidas para recolher, alojar, isolar,
alimentar e abrigar os loucos, os pobres, os criminosos
e todos os que não se adequassem às normas sociais,
sendo não raro castigados fisicamente com o intuito
de se comportarem bem através da aplicação do
“tratamento moral”, uma série de dispositivos de puni-
ção e recompensa que visava à reeducação do asilado.
Neste sentido Foucault (2000b) relata que o
asilo tinha por função não o tratamento, mas a tarefa
de promover a limpeza social dos indesejáveis, um
verdadeiro depósito de isolamento e exclusão visando
a segregação social e não a cura (o louco foi igualado
ao miserável e ao criminoso, que só causavam
transtornos à cidade), característica que só mudaria
devido aos esforços de Pinel (1745-1826) que
concebeu a loucura como um problema médico-social
ainda que ligado à moral.
Para Pinel (conforme citado por Foucault,
2000b) os loucos deveriam ser tratados e não surrados,
deveriam ser “reeducados” em sua moral e
reinseridos na comunidade quando curados,
inaugurando a psiquiatria moderna que estudava e
tentava viabilizar a capacidade/incapacidade de
reinserir os loucos na sociedade - o pensamento
pineliano se insere no contexto de pressões sociais
da Revolução Francesa: internar sem perspectivas
de tratamento constituía privação da liberdade e
desrespeito aos direitos dos homens.
Combatida, mas não findada a prática de
castigos físicos, os séculos XVIII e XIX presenciariam
a medicalização da loucura (tornar médico um
problema que na origem era social). Segundo LanteriLaura (1994) via-se a loucura como desequilíbrio
organofisiológico do indivíduo devido à lesão no
cérebro com conseqüente não-adaptação às normas
sociais, sendo função da medicina readaptar o
indivíduo por intermédio de tratamento específico com
tônicos, sangrias, purgações, banhos, inoculação de
sarna, exercícios etc. A loucura neste contexto era
entendida como lesão orgânica que levaria a
desadaptação funcional do sujeito na sociedade.
Carrara (1998) comenta que a psiquiatrização
da loucura enfatizando a determinação orgânica198 Paidéia, 2007, 17(37), 195-206
levou, em meados do século XX, ao desenvolvimento
da farmacologização e nova pressão pela hospitalização/internamento do doente como única
possibilidade de cura, pois o psiquiatra, desde os fins
do século XVIII, tornara-se o local sabedor da
loucura, o organizador do espaço da instituição
psiquiátrica e da direção do tratamento, sendo esta
instituição (o hospital, o manicômio) o paradigma de
cura mesmo quando existissem dispositivos extraasilares e recursos inter ou multiprofissionais.
O hospital psiquiátrico se inseria segundo
Foucault (1999) nos dispositivos disciplinares de
“aprisionamento dos corpos”, ou segundo Goffman
(1974) seria um dos tipos de “instituições totais”, cujas
principais características seriam o constante controle
do tempo, espaço e ações dos internos/loucos, a
submissão inquestionável destes aos poucos
profissionais que estabelecem os tratamentos e
perspectivas de recuperação, a impossibilidade do
interno decidir sair da instituição ou interromper o
tratamento, em suma, de promoverem a exclusão
social dos que propuseram tratar.
Ainda segundo Foucault (1999) e Goffman
(1974) nestas instituições haveria uma clara divisão
entre o grupo que controla (técnicos especializados)
e o controlado (internos) causando submissão dos
segundos aos primeiros que não raro extrapolaria as
medidas ditas terapêuticas consideradas necessárias
pelos especialistas, gerando privações extras aos
internos como: barrar/restringir o acesso à informação,
estabelecer a ociosidade generalizada e a ausência
de atividades que visassem a recuperação adequada,
confinamento excessivo, violação de correspondência
pessoal, negação de possuírem objetos pessoais ou
estimados, agressões físicas quando não cumpridas
as “regras”, enquadramento forçado em atividades
coletivas (horários para banho, alimentação, acesso
a pavilhões, alas, quartos e atividades, uso de
uniformes e cortes de cabelo), medicação obrigatória,
uso do eletrochoque e celas-fortes como punições,
entre outros.

Início arrow Biblioteca arrow Arquivo das Notícias arrow saúde arrow Doença mental é caso de justiça no Brasil
Doença mental é caso de justiça no BrasilPDFImprimirE-mail
15 de dezembro de 2006
.thumb_rua.jpgA situação dos doentes mentais moradores de rua é muito grave. O programa Saúde da Família sem domicílio, da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, mostra que 30% dos 2 mil sem teto naquela cidade "apresentam sintomas de esquizofrenia, alucinações visuais e auditivas, retardo mental e comportamento agressivo". Segundo dados apresentados no XXIV Congresso Brasileiro de Psiquiatria, atualmente 500 mil pessoas vivem nas ruas do País, 30% dos quais são doentes mentais e 50% deles são dependentes de álcool ou drogas, chamados dependentes químicos.

Adital - Segundo dados da OMS, inclusive, mais de 30% da população, independente de classe social, credo ou cor, necessitam de algum atendimento psiquiátrico.O Ministério da Saúde brasileiro, sem uma política adequada para o atendimento ao doente mental, vem praticando uma reforma psiquiátrica, editando portarias, sem levar em conta as reais necessidades da população.

- A única preocupação é fechar hospitais e reduzir leitos, como se a doença não existisse mais ou a população parasse de crescer. Faltam medicamentos, ambulatórios, tudo. O governo tinha que se preocupar com os três níveis de atendimento que o doente mental precisa: um trabalho preventivo com boas campanhas esclarecedoras para doentes e familiares; garantir o atendimento em ambulatórios, a distribuição de remédio e a manutenção da dosagem correta para cada caso, e, em último caso, a internação nos momentos de crise aguda ou dos crônicos em crise - diz Lídia Nogueira, do movimento Grupos representativos de Doentes Mentais do Rio de Janeiro.

Reforma psiquiátrica aumenta número de doentes nas ruas e prisões

A situação dos doentes mentais moradores de rua é muito grave. O programa Saúde da Família sem domicílio, da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, mostra que 30% dos 2 mil sem teto naquela cidade "apresentam sintomas de esquizofrenia, alucinações visuais e auditivas, retardo mental e comportamento agressivo". Segundo dados apresentados no XXIV Congresso Brasileiro de Psiquiatria, atualmente 500 mil pessoas vivem nas ruas do País, 30% dos quais são doentes mentais e 50% deles são dependentes de álcool ou drogas, chamados dependentes químicos.

Por tudo isso, grupos representativos de familiares e doentes mentais querem uma rediscussão do tratamento e assistência à pessoa portadora de transtornos mentais. Lídia Nogueira, professora, familiar de doente mental, há 10 anos se dedica a atender e encaminhar para tratamento pessoas com problemas mentais, desde dependência química até casos de crises graves.
- O Brasil precisa discutir urgentemente a doença mental nos seus três níveis de assistência: o tratamento em ambulatório, os serviços extra-hospitalares e, como última opção, a internação.

A principal discussão é o atendimento nos ambulatórios. Os pacientes levam até três meses para conseguir uma consulta e quando consegue ser atendido corre o risco do lugar não ter receituário para medicamento controlado nem o medicamento.

Os responsáveis por essa situação são os três poderes de governo: secretarias de saúde municipal, estadual e Ministério da Saúde.

- Noventa por cento dos doentes dependem de medicamento, que é o oxigênio da psiquiatria. Sem esse primeiro atendimento, sem a medicação adequada, o doente mental pode entrar em crise em casa, na rua, no hospital e nas prisões.

- É preciso criar um sistema de atendimento para identificação e retirada dessas pessoas da rua - continua ela. Uma central de informações nacional - porque eles se movimentam mesmo a pé, e transitam de um estado a outro. A situação é tão grave que muitos municípios, para se livrar do problema, pegam os doentes que transitam por suas ruas e levam para outros municípios, soltando-os abandonados, num lugar que eles não conhecem. Eles ficam assustados e cada vez se movimentam para lugares mais distantes de suas famílias.

Na rua, eles continuam procriando, tendo filhos, que nascem sem qualquer identificação, sem nome e sem família e com muitas possibilidades para seguir o mesmo caminho dos pais.

Em 1993, a prefeitura do Rio de Janeiro assinou um protocolo de intenções para atendimento ao doente mental mendigo. O prefeito César Maia prometeu que a implantação se daria em pouquíssimo tempo, mas o projeto nunca saiu do papel.

Sem saída: doente que escapa da rua acaba na prisão

Tão grave quanto estar nas ruas é o fato de muitos estarem presos porque não têm família e a polícia não consegue distinguir o doente mental do criminoso comum.

Um caso com grande repercussão no Rio, foi o da pensionista Solange, que numa crise ateou fogo numa mulher, que estava na fila do banco. Ela não tinha nenhum documento, nenhuma receita, nenhum laudo médico ou familiar que mostrasse que era portadora de transtorno mental. Ela foi presa como uma criminosa violenta. No entanto, ela é de uma família com histórico de doentes mentais e, segundo relato dos vizinhos, costuma ter crises noturnas com muitos gritos e pedidos de socorro por estar sendo queimada, embora estivesse sozinha em casa. Mais uma vez, dona Lídia teve que entrar em ação:

- Desconfiei que alguma estivesse errada e procurei a vizinhança para saber o que acontecia com aquela mulher. Ela vivia sozinha e tudo indicava que fosse uma doente sem tratamento. Ouvi os vizinhos, levei o caso para a promotoria e conseguimos que ela fosse avaliada e hoje está no manicômio judiciário aguardando julgamento.

O que é a reforma psiquiátrica?

A reforma psiquiátrica ajudou a melhorar as condições de atendimento nos hospitais, onde os doentes viviam em condições subumanas. Mas as soluções propostas não resolvem os problemas de doentes e familiares. Por lei, cada estado e município tem que ter uma estrutura de assistência em ambulatórios, Centros de atenção psico-social (CAPS), hospital dia, hospital noite, NAPS - núcleo de atenção psico-social, residência terapêutica, todos com equipes multidisciplinares e medicação variada.

Mas nada disso existe na realidade. No Rio de Janeiro, por exemplo, apenas dois municípios atendem com um mínimo de dignidade: Caxias e Paracambi. Nem a capital do estado está preparada para atender doentes mentais, diz Dona Lídia:

- Em Caxias tem dois CAPS, um sistema chamado "porta de entrada" com equipe multidisciplinar completa. Os doentes são higienizados, avaliados, medicados e encaminhados para tratamento. Porém, não consegue atender a todos os que precisam. A sua capacidade não chega a 50%. Paracambi, que tem 200 mil habitantes, atende a toda a população doente, nos três níveis de assistência.

Ela continua:

- O Ministério da Saúde não se preocupa com o atendimento em ambulatório. Muitas vezes o paciente consegue uma consulta, recebe a prescrição e a dose específica para a crise. Como só vai conseguir ser atendido novamente, no mínimo, em 90 dias, fica tomando remédio com dosagem superior a que realmente precisaria. Na próxima consulta, é atendido pelo médico de plantão, que nem sempre é o mesmo. Este novo médico, não conhecendo o paciente, com base nas informações do prontuário, acaba mantendo a medicação. Uma verdadeira bola de neve. Quando em crise, tem dificuldade para ser atendido. Atendido, acaba medicado inadequadamente

fonte: Adital

DOENTES MENTAIS, MORTES, DROGAS E…

Há cerca de 10 doentes mentais presos no Complexo Penitenciário de Pedrinhas. O artigo 26 do Código Penal aponta que os doentes mentais são inimputáveis. Ao repórter Gilberto Costa, da Agência Brasil o juiz Douglas Martins, da Vara de Execução Penal da Capital se disse “perplexo”. Em seguida definiu a “constatação como gravíssima”.

A constatação foi feita pelo ouvidor nacional da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Ferminio Fechio, durante visita na semana passada ao Complexo Penitenciário de Pedrinhas.

No Brasil 12% da população tem transtornos mentais graves, segundo o Ministério da Saúde. Além do “tratamento criminal” ofertado pelo sistema prisional do estado, esses casos também estão nas estatísticas de saúde pública.

A Ferminio Fechio a Comissão de Direitos Humanos da seccional maranhense da

Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) 43 presos foram assassinados dentro das delegacias e/ou presídios no Maranhão desde 2008.

A Agência Brasil o promotor de Execução Penal do Maranhão, Willer Siqueira Mendes Gomes afirmou que as 43 mortes também têm a ver rebeliões e tráficos de drogas. O representante ministerial acredita que comércio de drogas no sistema prisional de faz mesmo o quê?

“Essas mortes estão vinculadas à comercialização de drogas no interior dos presídios. Há indício que haja comercialização de drogas no sistema carcerário”, afirmou Willer ao repórter Gilberto Costa.

Sobre as 43 execuções de presos, o titular da 27ª Promotoria de Justiça Criminal declarou ainda que “a impunidade na apuração dos responsáveis pelos casos de tortura e execução de pessoas presas no Estado ocorre por corporativismo”, disse Willer.

Então para o Ministério Público se tortura e se mata no cárcere – não se apura – por espírito de corpo. Segundo Josiane Gamba, da Sociedade Maranhense de Direitos Humanos e ex-secretária-adjunta de Direitos Humanos do governo Jackson Lago (PDT), “há promotores que defendem os direitos humanos, mas eles são exceção”, lamentou.

Será que a regra entre os promotores é achar que o cárcere é o local de onde os cavalos – neste caso as bestas-feras que povoam as cadeias maranhenses – saíam para o espetáculo nos antigos circo romanos?

Ao certo mesmo, é que no MP, tanto quanto no Judiciário, quanto no Jornalismo, quanto na sociedade é consistente as noções primitivas e emocionalizadas de que se fez ou faz Justiça quando se mata nas cadeias e ou/presídios. É uma pena de morte às avessas.

Esquecem-se que a pena de morte além de abjeto, é ineficaz no combate à criminalidade. Não cabe, por corporativismo ou inépcia, entregar ao Estado – e seus agentes -, instituição humana, falível e submissa à pressão dos mais variados interesses, o poder de decidir irreversivelmente sobre a vida de uma pessoa.

2 Comentários para “DOENTES MENTAIS, MORTES, DROGAS E…”

  1. Marcos Oliveira Diz:

    Numa nota publicada na coluna o Estado Maior , de O Estado se comemora a redução do número dee mortes entre os governos Roseana Sarney e Jackson Lago, isso que é estreiteza jornalística.

  2. Luis Augusto Diz:

    O juiz Douglas Martins foi infeliz na fala dele. Apenas admitir que existe o problema mas não ter ação efetiva sobre o fato é o mais do mesmo. Também acho que não resolve criar uma secretaria de Justiça para solucionar essa questão, no governo do José Reinaldo Tavares h